Os Atos dos Apóstolos contam esse episódio da vida de Paulo:

“A multidão então se levantou contra eles (Paulo e Silas) e os magistrados mandaram arrancar suas vestes e espancá-los e, depois de tantos golpes e acoites, jogaram-nos na prisão e ordenaram que o carcereiro mantivesse guarda com segurança. Ele recebeu essa ordem e os jogou na parte mais interna da prisão e prendeu-lhes os pés ao cepo. Por volta da meia-noite, Paulo e Silas, em oração, cantavam hinos a Deus, enquanto os prisioneiros os ouviam. De repente, um terremoto ficou tão forte que os fundamentos da prisão foram abalados; imediatamente todas as portas se abriram e as correntes de todos caíram “(Atos dos Apóstolos, 16, 22-26).

Com vestes esfarrapadas, carregados de pancadas, os pés presos ao cepo, Paulo e Silas não rezam a Deus para ajudá-los, mas cantam hinos a Deus. Que mensagem para nós da Renovação Carismatica Católica neste momento! O exemplo de Paulo e Silas nos convida a deixar de lado, pelo menos daqui para Pentecostes, qualquer discurso sobre o Coronavírus, ou pelo menos para não o tornar o centro de tudo; não fazer mal ao Espírito Santo considerando-o menos importante (e menos poderoso) que o vírus.

Além disso, nos convida a louvar e cantar hinos a Deus, o que pode parecer absurdo e difícil de aceitar, especialmente para aqueles que estão experimentando os efeitos devastadores desse flagelo em sua própria pele, mas com fé podemos pelo menos entender que isso é possível. São Paulo proclama que “tudo contribui para o bem, para os que amam a Deus” (Rom 8:28). Tudo, nada excluído, portanto, também a presente pandemia! Santo Agostinho explica a profunda razão disso: “Sendo supremamente bom, Deus nunca permitiria que algum mal existisse em suas obras, se não fosse poderoso e bom o suficiente, para tirar o bem do próprio mal” (Enchiridion, 11, 3).

Nós não louvamos a Deus pelo mal que está trazendo toda a humanidade de joelhos; O louvamos pelo que temos certeza de que Ele será capaz de tirar o bem desse mal, por nós e pelo mundo. Nós o louvamos, convencidos, de fato, de que tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus e, acima de tudo, que são amados por Deus! Digo isso tremendo porque não sei se eu seria capaz de fazê-lo à prova dos fatos, mas a graça de Deus pode fazer isso e muito mais.

No sermão da Sexta-feira Santa, em São Pedro, tentei identificar alguns “bens” que Deus já está tirando do mal: o despertar da ilusão de nos salvar sozinhos, com a técnica e a ciência; o sentimento de solidariedade de que o mal está despertando e que, em alguns casos, chega ao heroísmo. Agora eu acrescentaria: o despertar do sentimento religioso e a necessidade de oração. A atenção extraordinária aos gestos e palavras do Papa Francisco, não apenas pelos católicos, é um sinal disso.

Para os Tessalonicenses, o mesmo apóstolo Paulo recomendou: “Em todas as coisas dai graças” (1 Tes 5.18). Louvor e ação de graças, Doxologia e Eucaristia: esses são os dois principais deveres do homem para com Deus. O pecado básico da humanidade, do qual, segundo o apóstolo, todos os outros pecados deriva, é a recusa dessas duas atitudes: “Eles, portanto, (os homens) são indesculpáveis porque, apesar de conhecerem a Deus, não O glorificaram (doxazein) ou agradeceram (eucharistein) por Deus ser conveniente ”(Rom 1, 20-21).

O exato oposto do pecado, portanto, não é virtude, mas louvor! O louvor a Deus, feito em condições dramáticas como as de hoje, é a fé levada ao seu mais alto grau. Jesus, acalmou a tempestade, não repreendeu os apóstolos por não tê-Lo acordado antes, mas por não ter tido fé suficiente.

É uma oportunidade para nós da Renovação Carismatica Católica retornar às origens mais puras da corrente da graça. Quando surgiu, apareceu ao resto do cristianismo como o povo de louvor, o povo do Aleluia.

Nós não estávamos sozinhos. A mesma experiência estava ocorrendo entre os irmãos pentecostais. Um dos livros mais lidos na Renovação Carismatica Catolica, depois de “A Cruz e o Punhal” (“The Cross and the Switchblade”), de David Wilkerson, foi o livro de Merlin Carothers “Da Prisao ao Louvor” (“Prison to Praise”). O autor não se limitou a recomendar a importância do louvor, mas demonstrou – a Escritura e as experiências em mãos – o poder milagroso dele.

Os maiores milagres do Espírito Santo não ocorrem em resposta às nossas súplicas, mas em resposta ao louvor. Mesmo dos três jovenzinhos judeus, jogados na fornalha ardente, lemos que “com uma só voz, eles começaram a louvar, glorificar, bendizer a Deus, entoando o cântico com o qual a liturgia começa a oração das Laudes todos os domingos e festas: “Bendito és, Senhor, Deus de nossos pais …” (Dan 3, 51 ss.). O maior milagre de louvor é o que ocorre naqueles que o praticam, especialmente na provação. Mostra que a graça tem sido mais forte que a natureza.

O milagre de Paulo e Silas na prisão – e dos três jovens na fornalha ardente – se repete de infinitas maneiras e circunstâncias: libertação da doença, do vício em drogas, de uma condenação injusta, do desespero, do próprio passado… Provar para crer, foi a sugestão que o autor do livro fez aos leitores.

Afoguemos, então, o vírus no mar do louvor, ou ao menos esforcemo-nos em fazê-lo; nos opomos à pandemia com a Doxologia. Unamo-nos a toda a Igreja que, no Glória da Santa Missa, proclama: “Nós Te louvamos, Te bendizemos, Te adoramos, Te glorificamos, Te damos graças por Tua imensa glória”. Sem súplicas, apenas louvor nesta oração!

Esperando pelo Pentecostes, voltemos a cantar com o ímpeto de outrora as músicas que muitos de nós derramaram lágrimas no primeiro impacto com a corrente de graça da Renovação Carismatica Católica: “Eu louvarei, louvarei (Alabaré, Alabaré”), “Venha Adorar (Come and Worship)”, “Sacerdócio Real (Royal Priesthood)” e muitos outros.

Há uma música que eu gostaria de destacar em particular por sua relevância no momento. Foi composta em 1992 por Don Moen. Seu refrão, no texto original em inglês, diz:

Oh, God will make a way

Where there seems to be no way

He works in ways we cannot see

He will make a way for me.

 

Uma tradução poderia ser: 

Ó, Deus abrirá o caminho

Onde parece não ter saída

Ele age de modo que não podemos ver

Ele dará a direção para mim

 

Não só a mim, mas a humanidade inteira!

 

Padre Raniero Cantalamessa O.F.M.Cap.

 

 

 

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